Ferramentas Tecnológicas a Favor da Aprendizagem
Raíza Brustolin
Diretora do NITE – Núcleo Integrado de Gestão e Tecnologias Educacionais
“A real educação reúne uma quantidade imensa de estímulos - emocionais, intelectuais, físicos. Um computador não consegue substituir todos eles, de modo que a mediação de um professor será sempre fundamental” (Autor não identificado).
No presente momento é possível identificar diversos vetores que sinalizam para a ampliação do uso da tecnologia no processo educacional, esses aspectos movimentam e são movimentados criando uma sinergia que nos leva a uma concepção de ensino aprendizagem mediada por essa nossa ferramenta. Entre os diversos elementos que fazem parte desse movimento podemos mencionar:
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A possibilidade de utilizar até 40% de carga horária à distância em cursos presenciais;
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A crescente popularização de metodologias ativas e abordagens como o Ensino Híbrido;
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Modelos de negócio educacionais que visam a escalabilidade;
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E o crescimento das Startups de Educação, as Edtechs, que segundo o Mapeamento Edtech 2020, realizado pela Associação Brasileira de Startups (Abstartups) em parceria com o Centro de Inovação para a Educação Brasileira (CIEB) tiveram o aumento de 26% em 2020 em relação a 2019;
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A implementação do Ensino Emergencial Remoto durante a pandemia da COVID-19.
Contudo, chamo a atenção para o mais importante deles: O cenário cultural, em que as relações são permeadas pelas tecnologias, havendo um uso exponencial de dispositivos eletrônicos e por sua vez uma geração de crianças, adolescentes e jovens que crescem em mundo dinâmico; visual e em rede. Esse processo começou na década de 70, nos Estados Unidos com o surgimento da internet – e do ciberespaço (LÉVY, 2010).
Como consequência desse fenômeno tecnosocial (LEVY, 2010), o uso da tecnologia no processo educacional não é apenas uma necessidade, mas uma busca por coerência com o contexto em que vivemos. Contudo, nesse cenário de necessidade de “atualização”, cria-se um discurso de urgência que leva professores e instituições de ensino, na ânsia de corresponderem a essa expectativa (ou mesmo na ânsia de terem vários de seus problemas resolvidos, na medida em que muitos concebem o digital como solucionador de problemas), a utilizarem ferramentas tecnológicas na educação o que por sua vez tem como consequência, em sua maioria, o uso conteudista da mesma, substituindo um modelo analógico por um digital; o que por sua vez não está errado, mas diminui e limita o potencial da tecnologia enquanto “ferramenta” para potencialização do processo de ensino aprendizagem. Masetto (2000) deixa claro que as tecnologias não possuem um fim em si mesmas, mas ganham significado quando são meio para um objetivo específico.
O ensino remoto emergencial praticado durante a pandemia da COVID-19 evidenciou ainda mais o quanto utilizar de processos tecnológicos mantendo as metodologias e práticas educativas torna-se pouco relevante na contribuição para o processo de ensino e aprendizagem. Professores exaustos por passar horas em frente a tela do computador, tendo a necessidade de aprender rapidamente diversas ferramentas, desmotivados pela falta de engajamento dos alunos – sem abrir as câmeras, ou sem participar da aula. Alunos igualmente cansados e desmotivados, e muitos sem sentir que estavam realmente aprendendo. Sem mencionar aqui a dificuldade com aparelhos e internet. Por fim, aprendemos e estamos em um processo de reflexão e adaptação dos nossos modelos pedagógicos buscando a coerência com o nosso cenário.
É nesse sentido que proponho que devemos refletir sobre a forma com que utilizamos as tecnologias no processo de ensino aprendizagem, para utilizar de seu potencial para promover a aprendizagem podemos conceber sua aplicação com os seguintes objetivos:
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Promover a interação
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Promover a colaboração
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Promover a criação
Esses três pontos podem ser contemplados com tranquilidade se considerarmos as metodologias e estratégias ativas de aprendizagem, que ao contrário do que muitos pensam, não necessariamente implicam no uso de ferramentas tecnológicas e muito menos na diversão e ludicidade, apesar de ambos os aspectos serem sempre muito bem-vindos às aulas.
O que chamo atenção aqui é para irmos além, estratégias, ferramentas e metodologias terão pouco impacto se não houver um planejamento que tenha como objetivo o desenvolvimento de competências, ou seja, muito mais do que apenas conteúdo, a capacidade de resolver problemas em qualquer situação – uma aprendizagem para a ação (ZABALA, 2020).
Ao considerar um planejamento que considere o desenvolvimento de competências, que tenha objetivos de aprendizagem e critérios de avaliação bem definidos, podemos nele utilizar diversas estratégias com ferramentas tecnológicas, como as que listo a seguir.
1. Promovendo a interação - Elaborar perguntas objetivas sobre o conteúdo disponibilizado no ambiente virtual de aprendizagem antes da aula.
Essa estratégia parece simples, mas quando associada à Sala de Aula Invertida – modalidade do ensino híbrido, em que o aluno estuda antes da aula e durante a aula a aprofunda, debate e aplica o que estudou - pode contribuir para estimular os alunos a estudarem o conteúdo previamente (Uma “dor” de todos que migram do modelo convencional para um modelo híbrido com sala de aula invertida), podem, também, fornece um dado diagnóstico ao professor a respeito do nível de compreensão dos alunos sobre o que foi estudado. Se essa estratégia for realizada com um aplicativo gamificado como o kahoot, em que eles fazem de maneira assíncrona antes do momento da aula, pode gerar expectativa nos alunos para durante a aula saber quem acertou mais ou em que posição ele ficou estimulando o engajamento e a motivação.
Essa estratégia também pode ser utilizada na sala de aula invertida, no início da aula de forma síncrona, possibilitando não só um diagnóstico da compreensão dos alunos, mas um alinhamento em relação ao que todos compreenderam na medida em que se para em cada questão para explicar o porquê da alternativa correta. É válido salientar, utilizar aplicativos de quis sem corrigir as perguntas com os estudantes pode ser pouco significativo.
2. Promovendo a colaboração - Aplicar aprendizagem por pares, promovendo o debate das perguntas, antes de liberar o gabarito.
O “peer instruction” foi criado por Eric Mazur (2015) – professor da Universidade de Harvard -em um curso introdutório de física. A metodologia possui alguns passos: Após uma explicação breve aplica-se uma pergunta objetiva, sem mostrar às respostas aos alunos o professor avalia o percentual de acertos, se for abaixo de 70% o professor libera a pergunta novamente estimulando que os alunos debatam as possibilidades de resposta em duplas, após o debate – com um tempo já pré-estabelecido – eles respondem novamente, geralmente após o debate a taxa de acertos da turma fica acima de 70%, nesse caso o professor mostra a resposta correta alinhando seu porquê junto aos alunos.
Essa estratégia pode ser adaptada, alterando os percentuais, sendo aplicada após o conteúdo ter sido estudado pelos alunos no ambiente virtual ou em uma aula anterior, e com um nível de questões complexas o suficiente para que possam ser discutidas, promovendo o engajamento dos alunos para a resolução do problema.
O aplicativo ideal para essa atividade é o Socrative, ele gera os percentuais de acerto sem mostrar o gabarito aos alunos e pode gerar relatório das questões que houve maior e menor índice de acerto, para auxiliar o professor a mensurar a compreensão da turma sobre os assuntos abordados.
3. Promovendo a criação - Os alunos produzem quiz e aplicam com seus colegas.
A forma mais comum de utilização de aplicativos de quiz é a de verificação da aprendizagem após uma exposição teórica normalmente longa, mas nessa atividade, terminada aí, sem nenhum tipo de aplicação posterior, o aluno ainda é passivo e apenas responde às questões. E se quem elabora e aplica as questões é ele? Sabemos que elaborar questões (que não sejam um “copia e cola” do texto) exigem apropriação do conhecimento.
Nesse caso, os próprios alunos podem elaborar seu quiz sobre o conteúdo e aplicar com seus colegas, é possível dividir a turma em dois times e um desafia o outro. Bem como as outras estratégias, essa atividade de conhecimento podem ser mais significativas se aplicada à sala de aula invertida, aproveitando o tempo seguinte para trabalhar um estudo de caso ou mesmo dar continuidade às próximas etapas do projeto – que pode ser uma etapa de teorização em que os alunos precisam buscar conhecimento para compreender o problema e então elaborar uma proposta de solução. Essa atividade pode ser aplicada com os mais diversos aplicativos de quiz – Kahoot, Socrative, Quizizz.
Essas são apenas algumas estratégias que ilustram como a tecnologia pode ser utilizada de forma mais significativa. Porém, se utilizarmos a metodologia de projetos, buscando o desenvolvimento de uma competência a tecnologia a ser utilizada ficará a cargo de cada etapa de desenvolvimento – podem ser ferramentas de planilhas (Como o Excel), editores de texto (Como o Word), recursos para desenvolver recursos visuais como o Canva – que fornece templates para a elaboração de materiais visuais, ferramentas de gerenciamento de atividades como o trello etc. Aplicando assim a tecnologia exatamente como meio e não como acessório.
Quer saber mais sobre como aplicar ferramentas tecnológicas em estratégias específicas? Recomendo o livro “A sala de aula digital” de autoria de Fausto Camargo e Thuinie Daros, publicado recentemente pela editora “Penso”.